Os desafios para o futuro da suinicultura são muitos e não podemos ignorar os novos movimentos que põem em causa a produção animal. Mas a crise que se vive é também uma oportunidade de crescimento para os países do sul, com Portugal a ganhar à boleia de Espanha.
António Tavares*
A atividade suinícola em Portugal e na Europa tem desde que me lembro fortes baixas e fortes altas o que motivou que no nosso país fosse considerada como um negócio de “trombada”.
Neste momento, estamos a atravessar uma forte crise com preços muito baixos para os nossos porcos e preços altíssimos das matérias-primas para as rações.
A razão é sempre a mesma, ou seja, a correlação entre a oferta e a procura.
A produção europeia tem vindo a crescer nos últimos anos fruto sobretudo de um aumento de produtividade e de eficiência produtiva, atingindo taxas de autoaprovisionamento interno de 118% a 129%.
O consumo interno tem vindo a diminuir devido aos ataques de que o nosso setor tem vindo a ser alvo e também devido ao aparecimento do movimento vegan. Assim, o equilíbrio de mercado tem vindo a ser obtido com as exportações para países terceiros e foi efetivamente devido ao abaixamento do nível de exportações por um lado e por outro a diminuição dos preços na China (nosso principal cliente) que entrámos na crise que hoje vivemos.
Costumamos dizer que cada crise é sempre pior que a antecedente, mas esta que atravessamos pode vir a ser muito diferente uma vez que devido a uma série de condicionalismos internos pode vir a provocar fortes alterações na estrutura produtiva a nível europeu.
A nível político europeu vivemos uma situação difícil uma vez que temos um Comissário da Agricultura que é frontalmente contra as produções industriais, defendendo as pequenas explorações e o comércio de proximidade. Temos uma Presidente da Comissão que defende a agricultura biológica com uma meta de 25% para 2030. E temos um Vice-presidente da Comissão que manda também na agricultura e que lançou o “Farm to Fork”, programa que nos vai exigir fortes investimentos nas nossas explorações.
Neste momento, temos uma mudança política na Alemanha com o partido dos Verdes a ficar com o Ministério da Agricultura anunciando imediatamente metas de 30% para a agricultura biológica para 2030, novas e mais restritivas medidas no bem-estar animal e multas ambientais para processos crime.
Por outro lado, os movimentos vegan e anti-carne, que representam uma pequena minoria da população, têm normalmente mais tempo de antena do que todo o setor agrícola. Não podemos desprezar o aparecimento da “carne” sintética feita em laboratório que já está no mercado.
Falando em termos de futuro, estou convencido de que a China vai voltar outra vez em força aos mercados e que vamos ter uma subida do preço dos porcos nos primeiros meses do ano, sendo que as matérias-primas devem manter-se a níveis altos até à próxima colheita.
Esta situação não vai seguramente evitar que muitos produtores europeus parem com a produção e que se registe uma forte reestruturação do sistema de produção a nível europeu.
A meu ver, a produção futura estará fortemente comprometida nos pequenos países que têm estruturas pequenas e de baixa produtividade. O exemplo disso são os países como os estados bálticos onde hoje em dia o preço dos porcos anda entre os 65 a 70 Cts (peso vivo).
Por outro lado, os pequenos produtores que não estejam organizados em organizações de produtores fortes e bem estruturadas vão ter grande dificuldade em sobreviver.
As restrições ambientais vão também ter um papel importante e o tratamento de efluentes em países que têm pouca área agrícola como a Dinamarca, Holanda e Bélgica, vai começar a ter um peso importante no custo de produção tirando assim competitividade a estes países. A Alemanha, segundo maior produtor europeu, vai ter nos próximos anos um governo que vai condicionar fortemente a produção de porcos e espera-se uma redução considerável dos efetivos porcinos a curto prazo. Os antigos países de leste como Polónia, Roménia, Bulgária têm vindo a mostrar as suas debilidades a nível estrutural e de decisão política e a prova evidente tem sido o modo como têm lidado com a Peste Suína Africana, provocando fortes prejuízos aos produtores.
Em resumo, a produção vai concentrar-se prioritariamente nos países do sul e vai ser liderada pela Espanha. O nosso país, apesar de ser pequeno, está muito ligado a Espanha e pode (e deve) apanhar boleia estruturando-se ao nível dos matadouros de modo a virmos a ser cada vez mais competitivos.
Em resumo, diria que temos grandes desafios pela frente mas se soubermos aproveitar as oportunidades temos todas as condições para não só mantermos a suinicultura em Portugal mas também para crescermos a nível europeu.
*Presidente do Grupo de Trabalho da Carne de Porco no COPA-COGECA
Consultor da FPAS em Assuntos Europeus